domingo, 8 de setembro de 2019

Ultrassom terapêutico



O ultrassom terapêutico é um recurso amplamente utilizado na prática clínica do fisioterapeuta, tem como objetivos a redução da dor, o controle de processos inflamatórios, aceleração do reparo tecidual, tratamento de úlceras, estímulo à neovascularização em tecidos isquêmicos, integração de enxertos de pele total, consolidação de fraturas e pseudoartroses, entre outros. O ultrassom gera alteração de processos fisiológicos, como ativação de fibroblastos, produção de colágeno, aceleração do metabolismo celular, etc. É utilizado com diversas finalidades, desde o tratamento de lesões até fins estéticos. Sua aplicação não é invasiva, não traz desconforto para o paciente, e se aplicado corretamente, não gera efeitos adversos consideráveis (OLSSON, et. al, 2008).

O ultrassom é uma modalidade de energia sonora longitudinal, caracterizada por ondas de mais de 20KHz (acima do espectro da audição humana), de penetração profunda, que ao atingir os tecidos biológicos, é capaz de gerar alterações celulares por meio de efeitos térmicos e/ou mecânicos. Esta energia sonora é gerada em um transdutor, que transforma a energia elétrica em energia sonora. Este efeito é chamado de "piezoelétrico inverso". Devido a isto, o aparelho de ultrassom terapêutico necessita de corrente elétrica para funcionar.


À medida que o ultrassom atravessa o meio, parte da energia é refletida de volta para o cabeçote e parte é absorvida, levando a um aquecimento local. A atenuação ou perda de energia está relacionada a estes dois fenômenos, sendo que, nos tecidos biológicos, deve-se em grande parte à transformação da energia sonora em calor.

A onda ultrassônica pode sofrer reflexão, refração, absorção, atenuação e transmissão.

  • Reflexão: Consiste no retorno da energia incidente em direção à região de onde ela é oriunda, após entrar em contato com uma superfície refletora. A lei da reflexão, diz que durante a reflexão especular o ângulo em que a onda é incidente sobre a superfície é igual ao ângulo a que é refletida.
  • Refração: é a mudança na velocidade de uma onda ao atravessar a fronteira entre dois meios com diferentes índices de refração. A refração modifica a velocidade de propagação e o comprimento de onda, mantendo uma proporção direta. A constante de proporcionalidade é a frequência, que não se altera.
  • Absorção: relaciona-se à parcela de energia que persiste em um corpo após incidir sobre ele. Contrapõe-se às parcelas correspondentes à transmissão e à reflexão.
  • Atenuação: perda gradual de intensidade de qualquer tipo de fluxo através de um meio.
  • Transmissão: relaciona-se à parcela da energia incidente que não é absorvida nem refletida.

A aplicação a onda ultrassônica pode ser realizada de duas formas: contínua ou pulsada.

  • Contínua: produz maior quantidade de calor decorrente da vibração de partículas celulares, que através do atrito entre si é produzido o efeito térmico. Um efeito térmico fisiológico pode ser alcançado promovendo alívio da dor, diminuição da rigidez articular e aumento do fluxo sanguíneo local.
  • Pulsada: promove ação fisiológica no tecido sem produzir calor (efeito atérmico), decorrente do intervalo entre a transmissão das ondas que permite ao tecido dissipar o calor recebido, sendo que o tempo de aplicação pode ser calculado dividindo-se a área a ser tratada pela Área de Radiação Efetiva (ERA) do cabeçote transdutor (LEITE, 2013).

Os valores de frequência do ultrassom terapêutico podem variar de 0,5 a 5MHz, porém as duas frequências ultrassônicas mais utilizadas na prática clínica são: 1MHz e 3MHz. Quanto maior for a frequência, maior a absorção e menor a penetração.

  • 1MHz: com esta frequência, a perda de energia de forma longitudinal é menor, sendo mais efetiva para atingir tecidos mais profundos. Desta forma, seu uso é indicado em casos de lesões de tecidos como músculo, tendão, bursa, cápsula articular e osso. Também é útil para pacientes com alto percentual de gordura subcutânea.
  • 3MHz: mais efetivo para tratamento de tecidos superficiais, como pele e tecido adiposo (tecidos entre 1 e 2 cm de profundidade). Além disso, devido a esta frequência ser mais facilmente absorvida, o aquecimento local é gerado de forma mais rápida. O uso é desta frequência é mais frequente na fisioterapia dermatofuncional, visando procedimentos estéticos.



A intensidade da onda varia de 0,1 a 3W/cm².

Efeitos térmicos, mecânicos e biológicos

Em consequência das vibrações longitudinais provocadas pelo ultrassom, um gradiente de pressão é desenvolvido nas células (OLSSON, et. al, 2008). Como resultado desta variação de pressão, elementos da célula movem-se através de um efeito de micromassagem, que aumenta o metabolismo celular e o fluxo sanguíneo, que levará a um aumento do aporte de oxigênio e um aumento da temperatura local, agindo como um catalisador das reações fisiológicas locais.

O ultrassom é capaz de gerar um aumento de temperatura local maior, em um período de tempo menor do que o aparelho de diatermia por ondas curtas ou microondas, gerando pouca elevação de temperatura em tecidos superficiais, atingindo com maior efetividade os tecidos mais profundos, como músculos e tendões. Também há a vantagem de o calor gerado pela ultrassom ser mais localizado, evitando o aquecimento de tecidos vizinhos à área a ser tratada. Tais efeitos são influenciados por fatores como o tempo de irradiação local, a técnica de aplicação (estacionária ou móvel), a área de aplicação, e a presença de superfícies refletoras. A intensidade de aplicação é ponto fundamental para o sucesso de qualquer terapia, porém deve ser utilizada com precaução. Deve-se utilizar o mínimo de intensidade para se atingir o efeito desejado, sendo que o excesso pode levar a dano tecidual.

Existem muitas situações nas quais o ultrassom produz efeitos físicos, sem alterações significativas de temperatura (OLSSON, et. al, 2008). São os chamados efeitos atérmicos, como a cavitação, produção de correntes acústicas e ondas estacionárias. Os efeitos térmicos e atérmicos podem ocorrer conjuntamente.



  • Cavitação: oscilações da onda ultrassônica formam microbolhas de ar no interior dos tecidos.
    • Estável: bolhas oscilam dentro do tecido, tendo valor terapêutico, aumentando a difusão de Ca na membrana celular;
    • Instável ou transitória: alteração rápida das bolhas, colapso, gera alta pressão, levando a dano tecidual.
  • Microcorrentes: Movimento localizado e unidirecional de líquido ao redor das bolhas (cavitações).
    • Aumento da permeabilidade da membrana celular, aumentando a difusão de íons;
    • Aumento do aporte de mastócitos (FYFE & CHAHL, 1982);
    • Aumento da captação de cálcio (MORTIMER & DYSON, 1988);
    • Aumento da produção de fator de crescimento pelos macrófagos (YOUNG & DYSON, 1990).

Recomendações para o uso do ultrassom 

O ultrassom deve ser utilizado por profissional qualificado, com o devido conhecimento de seu funcionamento, benefícios e efeitos adversos desta modalidade terapêutica. Ao aplicar o ultrassom no paciente, é recomendado:

  • Observar a área que será tratada, bem como conhecer o paciente e o tipo de lesão. Como todo atendimento fisioterapêutico, é necessário realizar uma avaliação completa do paciente.
  • Ajustar os parâmetros. Escolher entre o modo pulsado ou contínuo, frequência de 1MHz ou 3MHz, calcular a intensidade apropriada e o tempo de aplicação.
  • Utilizar o correto agente de aplicação: gel terapêutico ou água (ultrassom subaquático), visto que a energia ultrassônica é facilmente dispersada no ar.
  • Realizar movimentos circulares, ou em formato de 8, para evitar acúmulo excessivo de energia em um único ponto, com risco de queimadura.

Profundidade atingida pelo ultrassom em diversos meios. Fonte na imagem. Clique para ver em tamanho maior.


Contraindicações ao uso do ultrassom

  • Sobre útero gravídico;
  • Áreas de tromboflebite;
  • Doença arterial periférica;
  • Sobre o sistema nervoso central;
  • Sobre o globo ocular;
  • Sobre as gônadas;
  • Sobre áreas de infecção aguda;
  • Sobre áreas pré-operatórias;
  • Presença de tumores malignos;
  • Durante estados febris;
  • Áreas com perda de sensibilidade;
  • Sobre o coração;
  • Portadores de marca-passo;
  • Regiões com metal, como placas e parafusos;
  • Epífises de crescimento; 

Padrões de movimentação do cabeçote


Fonoforese

A fonoforese, ou sonoforese, é a modalidade de tratamento em que utiliza-se o ultrassom para facilitar a aplicação de um medicamento através da pele. É uma forma eficiente para o transporte de substâncias par os tecidos, apresentando-se como alternativa à aplicação oral ou por meio de injeção intradérmica.

A vantagem desta técnica é que a aplicação da substância é localizada, não sendo necessário absorção pelo sistema digestivo, havendo menor possibilidade de efeitos colaterais devido à ações sistêmicas.

Os produtos mais utilizados na fonoforese são:

  • Produtos com efeitos sobre a circulação a base de histamina, castanha da índia, centelha asiática, cavalinha, Ginko Biloba, etc.
  • Medicamentos que favorecem a cicatrização de feridas, à base de enxofre, cavalinha etc.
  • Medicamentos com ação antiinflamatória (a maioria contém corticoesteróides).
  • Anticelulíticos à base de cafeína, silanóis, Thiomucase, ácido triiodotiroacético, incluindo aqueles utilizados para estimular a circulação sanguínea.


Evidências do uso do ultrassom

Devido à falta de evidências na literatura, a efetividade do uso do UST como método complementar no tratamento fisioterapêutico das diferentes lesões musculoesqueléticas ainda não está clara. Apesar dos diversos estudos científicos publicados sobre esse assunto, a Associação Americana de Fisioterapia (Physical Therapy Association) não apresenta um consenso em relação à dosagem relacionada aos parâmetros apropriados para o tratamento dessas lesões e o tempo adequado de aplicação. Existem controvérsias a respeito da padronização dos parâmetros utilizados na aplicação do UST, quanto ao tempo de aplicação, frequência e intensidade, tanto para o pulsado quanto para o contínuo (LEITE, 2013).

Referências:

  • OLSSON, D.C., MARTINS, V. M. V., PIPPI, N. L., MAZZANTI, A., TOGNOLI, G. K.; Ultrassom terapêutico na cicatrização tecidual; Ciência Rural, Santa Maria, v.38, n.4, p.1199-1207, jul, 2008;
  • LEITE, A. P. B., PONTIN, J.C.B., MARTIMBIANCO, A. L. C., CHAMLIAN, T.R.; Efetividade e segurança do ultrassom terapêutico nas afecções musculoesqueléticas: overview de revisões sistemáticas Cochrane; Acta Fisiatr. 2013;20(3):157-160;
  • FREITAS, T. P., FREITAS, L. S., STRECK, E. L.; Ultra-som terapêutico no mecanismo de cicatrização: uma revisão; Arquivos Catarinenses de Medicina Vol. 40, no . 1, de 2011;
  • PORTAL EDUCAÇÃO; Fonoforese; Disponível online em: https://www.portaleducacao.com.br/conteudo/artigos/conteudo/fonoforese/25477; Acesso em: 08/09/2019;
  • WIKIPÉDIA; Refração; Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Refra%C3%A7%C3%A3o; Acesso em: 08/09/2019;
  • WIKIPÉDIA, Reflexão; Disponível online em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Reflex%C3%A3o_(f%C3%ADsica); Acesso em: 08/09/2019;
  • WIKIPÉDIA; Absorção; Disponível online em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Absor%C3%A7%C3%A3o_(f%C3%ADsica); Acesso em: 08/09/2019;
  • WIKIPÉDIA; Atenuação; Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Atenua%C3%A7%C3%A3o; Acesso em: 08/09/2019;
  • WIKIPÉDIA; Transmissão; Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Transmiss%C3%A3o_(f%C3%ADsica); Acesso em: 08/09/2019;