sexta-feira, 19 de abril de 2019

Estudo de caso - Paciente com fratura acetabular





O acetábulo, conforme visto na imagem acima, é o soquete do quadril que se articula com a cabeça femoral. É formado pela junção das três porções do osso do quadril: Íleo, Ísquio e Púbis. As fraturas acetabulares não são comuns, estando normalmente associados com traumas de alta energia, como acidentes de carro. Têm importante prevalência na população com idade produtiva, acometendo mais comumente o sexo masculino. Também pode ocorrer na população idosa, pelo processo de fragilidade devido à idade ou por patologias que cursam com perda de integridade óssea, como osteoporose.

Nesta postagem, abordarei o caso de um paciente atendido por mim, com uma breve apresentação, revisão de literatura, e um resumo dos objetivos e condutas neste caso. Vale salientar que, cada paciente deve ser tratado individualmente, e a terapêutica deve ocorrer com base na avaliação.

Apresentação do caso

Paciente do sexo masculino, 28 anos, biólogo, sofreu acidente de trabalho no dia 01/02/2019, quando um quadriciclo caiu sobre seu joelho, transferindo a força do impacto através da diáfise do fêmur, fraturando o acetábulo esquerdo. No dia 06/02/2019, fez cirurgia de osteossíntese com colocação de placa e 9 parafusos; durante a cirurgia, o nervo ciático foi parcialmente lesado, ocasionando perda da condução nervosa através dos nervos fibular superficial e fibular profundo (L5, S1 e S2), resultando em perda dos movimentos de dorsiflexão e eversão do tornozelo esquerdo, acarretando pé levemente caído. Também há perda parcial de sensibilidade nos dermátomos dos nervos referidos. Caminha com auxílio de duas muletas, e foi orientado pelo médico a realizar apoio parcial sobre o membro lesionado, realizando carga de cerca de 15 a 20kg. Relata que no momento, o que mais o incomoda é o pé, devido à dor, perda de mobilidade e parestesia durante o trabalho. Apresenta amplitudes de movimento ativas e passivas preservadas, força grau 4 para todos os movimentos de quadril, pela escala do Medical Research Council (MRC), normorreflexo, esboça leve contração dos músculos extensores dos dedos no lado acometido. Já fez algumas sessões de fisioterapia, executando alguns exercícios rotineiramente conforme orientação. Oriento mais dois exercícios, a serem realizados diariamente, utilizando irradiação para a musculatura lesionada.




Revisão de literatura

As fraturas de acetábulo geralmente são de importante gravidade, por estarem associadas a traumas de alta energia e velocidade, como em acidentes de carro, acidentes de moto, quedas e diversas vezes em pacientes politraumatizados. A realização de fisioterapia tanto no pré-operatório quanto no pós-operatório é de fundamental importância para as funções respiratórias e motoras desse paciente viabilizando alta hospitalar precoce. As principais complicações cirúrgicas são lesões de nervo ciático, infecções, tromboembolismo pulmonar e complicações cardíacas. 


Estudos indicam maior prevalência desta lesão em pacientes do sexo masculino. Um importante trabalho sobre este assunto é o de Judet e Letournel, que criaram uma classificação para este tipo de fratura, dividindo-as em simples e associadas. As fraturas simples são da parede anterior, coluna anterior, parede posterior, coluna posterior e transversa; já as fraturas associadas correspondem em T, parede anterior ou coluna posterior associada à posterior hemitransversa, transversa associada à parede posterior, coluna posterior associada à parede posterior e coluna anterior associada à coluna posterior. Esta classificação permite a escolha da técnica cirúrgica apropriada, além de fazer relação com possíveis lesões dos tecidos circundantes ao local da fratura como lesões nervosas e vasculares. As fraturas da parede posterior e transversas normalmente cursam com luxação posterior e representam 15% a 28% das lesões acetabulares. 


Segundo Martimbianco, et. al (2008), em uma revisão bibliográfica, é possível encontrar protocolos de tratamento para fraturas de quadril, mas a maioria dos autores não inclui exercícios de propriocepção em seu plano. Os autores afirmam que o déficit de propriocepção pode ser um indicativo de futuras novas lesões. Portanto, exercícios com foco nesta qualidade física devem ser incluídos no programa de treinamento. 


No estudo de Tsauo (2005), foi utilizado um protocolo de tratamento fisioterapêutico por meio de visitas domiciliares que tinha os seguintes objetivos: 1: Exercícios de fortalecimento principalmente para flexores de quadril; 2: Exercícios para ganho de amplitude de movimento, principalmente na articulação do quadril; 3: Treinamento de balanço; 4: Treinamento funcional, como sentar e levantar, treino de deambulação, subir escadas; 5: Prática de transferências seguras e eficientes; 6: Ajuste de dispositivos de marcha; 7: Adaptação e modificação do ambiente doméstico. Tal protocolo demonstrou bons resultados na função e na qualidade de vida relacionada à saúde nos pacientes avaliados. 


Objetivos:

- Evolução da marcha: aumento progressivo da carga sobre o membro lesionado,
evoluindo para marcha com uma muleta, e depois sem muletas;

- Aumento de força e trofismo muscular em quadríceps e isquiotibiais no membro inferior esquerdo;

- Recuperação dos movimentos de dorsiflexão e eversão do tornozelo esquerdo;

- Propriocepção do membro inferior esquerdo;

- Relaxamento da musculatura do membro superior responsável pela sustentação do peso corporal na muleta;

- Reforço de músculos tibial anterior, extensor longo do hálux, extensor longo dos dedos, fibular terceiro, fibular longo, fibular curto. O objetivo é recuperar os movimentos de dorsiflexão e eversão, mas alguns desses músculos atuam na plantiflexão, portanto este movimento deve ser trabalhado;

- Redução de edema em tornozelo e pé esquerdo;

- Auxílio na cicatrização da ferida operatória.


Condutas:

 - Treino de marcha com aumento progressivo (a médio prazo) da carga sobre o
membro acometido;

 - Reforço da musculatura de coxa e perna no lado acometido, com ênfase em quadríceps, isquiotibiais, adutores e abdutores do quadril, dorsiflexores e eversores do tornozelo;

 - Exercícios de propriocepção de membro inferior no lado acometido;

 - Exercícios de irradiação para dorsiflexores e eversores;

 - Ganho de força em todos os movimentos do quadril;

 - Terapia manual em região de ombros e membros superiores (se necessário);

 - Aplicação de bandagem terapêutica em região antero-lateral da perna acometida;

 - Ultrassom contínuo 1MHz;

 - Laserterapia de baixa potência na região da cicatriz operatória;

 - Estimulação elétrica funcional (FES), médio prazo, necessário presença de condução nervosa no miótomo afetado.


Referências

  • MEDICAL RESEARCH COUNCIL; Aids to the investigation of peripheral nerve injuries. London, England: Her Majesty’s Stationery Office, 1976;
  • DIAS, D., CASTRO, S., SCHIPER, L., MATOS, M. A.; Avaliação funcional das fraturas do acetábulo: relato de caso; Revista Baiana de Saúde Pública, v. 34, supl. 1, p. 46-54 jul./dez. 2010;
  • MAIA, M. S., SANTOS, D. C. M., QUEIROGA, D. M., CASTRO, C. O., SILVA, R. M. F., REIS, A. C. B., DUCATTI, A. C.; Análise epidemiológica das fraturas acetabulares; Rev. bras. ortop. vol.46 no.1 São Paulo 2011;
  • MALTIMBIANCO, A. L. C., POLACHINI, L. O., CHAMLIAM, T. R., MASIERO, D.; Efeitos da propriocepção no processo de reabilitação das fraturas de quadril; Acta Ortopédica Brasileira, 2008, Acesso online em: 17 de Março de 2019; disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=65713425010;
  • TSAUO, J. Y., LEU, W-S., CHEN, Y-T., YANG, R-S.; Effects on Function and Quality of Life of Postoperative Home-Based Physical Therapy for Patients With Hip Fracture; Arch Phys Med Rehabil Vol 86, October 2005;